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Soluções que atuam na origem do problema: a criação de gado

Ao mesmo tempo que os estudos científicos sobre o impacto ambiental da agricultura se acumulam e a questão do bem-estar animal ocupa cada vez mais espaço nos debates sociais, muitas pessoas tentam encontrar formas de coabitar com os animais. É o caso de Virginia Markus que criou um santuário para animais na Suíça e ajuda os agricultores a mudarem de profissão.



"O meu dia a dia é o de um agricultor comum que acorda cedo para cuidar dos animais, limpar os espaços, fazer compras, ocupar-me da logística, contabilidade e administração de um lugar como este", explica Virginia Markus, fundadora e presidente da associação Co&xister.


Embora trabalhou inicialmente como educadora social, Virginia sempre conviveu com animais. Foi aos 24 anos que começou a fazer a afirmar publicamente as suas opiniões através dos seus livros, conferências e até investigações nas explorações agrícolas e num matadouro com recurso a uma câmara escondida. Em 2019, quando criou o seu santuário para animais na zona rural de Vaud, a sua vida deu uma verdadeira reviravolta.


O santuário acolhe durante todo o ano cerca de quarenta cabeças de gado, ou seja vacas, porcos ou ovelhas que estavam destinadas ao matadouro. "São animais que chegam ao santuário e que nunca mais saem, contrariamente ao funcionamento de um abrigo. Excepto em casos raros, onde sinto que os animais estariam melhor noutro local e aí tomo as medidas necessárias para encontrar um local que lhes seja mais adequado", explica a presidente. Assim, uma das missões da associação é permitir que os animais vivam uma vida digna, sem nunca correrem o risco de acabar num talho.


A associação também visa formar pessoas que desejam criar um santuário. "As pessoas vêm ao local e aprendem o que significa criar lugares como este e como é o dia-a-dia aqui", acrescenta Virginia Markus.


Desde 2021, também apoia agricultores na sua reconversão. "Mesmo que fale muitas vezes de agricultores, prefiro usar o termo profissional de criação porque engloba vários perfis. A maioria das pessoas que contactam-me são agricultores, mas já ajudei, por exemplo, uma mulher proprietária de um centro de equitação que criava cavalos. Ela quiz mudar de profissão porque há muitos maus-tratos aos animais no meio equestre. E também poderia acompanhar um carniceiro ou um técnico de laboratório se me pedissem", descreve.


"Esta missão específica requer bastantes recursos. Com a Co&xister o objetivo era ir além do simples acolhimento de animais. Trata-se de propor soluções que atuem na origem do problema, ou seja a criação de gado", explica a presidente.


Se Virginia Markus apoia três agricultores neste momento, ela está em discussões com cerca de dez deles ao mesmo tempo. Na verdade, estas reconversões podem ser feitas em três meses ou em três anos dependendo da situação e das circunstâncias. "Temos cerca de dez pessoas que ainda estão a pensar nisso. Este cenário muitas vezes acontece quando uma pessoa quer mudar, mas o parceiro não quer. E um dos dois acaba por retardar o processo", acrescenta ela. Desde 2021, seis agricultores concluíram a reconversão. E este tema preocupa cada vez mais as pessoas envolvidas. "Desde este ano, também trabalho na França. Acabei de conhecer uma primeira agricultora que deseja mudar de trabalho. É muito gratificante ver que o tema do bem-estar animal ultrapassa fronteiras", ela acentua.


Mas como exatamente esses profissionais de criação mudam de trabalho?


Segundo Virginia Markus, nem sempre é a reconversão em si que motiva as pessoas que ela ajuda. "O ponto em comum entre todas as pessoas que me contactaram é que de repente sentem-se incapazes de enviar um dos seus animais para o matadouro. E o facto de não poderem fazê-lo para um animal, leva-os a questionarem o seu trabalho de forma mais geral. Muitas vezes, estas pessoas contactam-me primeiro para poderem colocar o seu animal no santuário. E depois, quando veem este indivíduo a viver num santuário, a mudar de carácter e a florescer, dá-lhes vontade de oferecer o mesmo fim aos outros. De repente, continuar a explorar o resto do gado torna-se problemático", afirma a presidente.


A associação apoia os agricultores de acordo com as suas necessidades. Cada caso sendo único, Virginia Markus não recomenda um método rígido, e prefer escutar quem lhe pede ajuda. "A reconversão dos profissionais de criação é uma parte importante do meu trabalho: não há nada mais concreto do que ver mudanças acontecerem diante dos meus olhos. É uma sensação incrível ver que salvamos animais no curto prazo e também no longo prazo. Por exemplo, no caso de um agricultor que estou a ajudar neste momento e que tem uma criação de 300 animais, quantos animais vamos salvar no período da sua carreira? São centenas, até milhares de indivíduos", ela conta.


Além disso, desde 2023, colabora com outras associações em França e na Bélgica. E se isso encanta Virginia, ela também teme não conseguir acompanhar. "Para o futuro da associação, espero poder formar pessoas, nomeadamente em França, para poderem-me ajudar na reconversão dos agricultores. A dificuldade é encontrar pessoas que tenham experiência de campo no sector agrícola, porque acho que é importante sermos credíveis junto dos agricultores, mas também que tenham competências em trabalho social porque fazemos muito trabalho psicológico e emocional com essas pessoas", explica Virginia Markus.



Ela também espera um dia abrir um santuário na França: "permitiria-me ter os dois pés no chão para facilitar o trabalho". Enquanto espera que seus projetos futuros se concretizem, Virginia Markus tem muito orgulho na sua associação que conecta mundos que parecem opostos. Ela também acaba de publicar o seu terceiro livro O que os animais murmuram no qual ela compartilha as lições que a vaca Maya, a porca Ondée ou mesmo Tawaki o cavalo lhe deram e onde ela lhes dá um lugar central.


"Sempre fico muito emocionada de conviver diariamente com os animais, vê-los felizes, realizados e confiantes. E a história por trás de cada animal é muito comovente. Ver como suas histórias emocionam as pessoas que vêm ao santuário, é uma observação magnífica", conclui.

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